sexta-feira, 4 de abril de 2008

Açougue e oficina são cultura no DF

Cama e travesseiro, carro e garagem, arroz com feijão, escola e professor. Todas as pessoas são, em certa fase da vida, condicionadas a associar corretamente os pares. Só que, às vezes, é preciso aceitar que a ligação açougue e livro também pode ser correta. E as oficinas mecânicas, além dos parafusos, podem ser sedes perfeitas para peças teatrais. No Distrito Federal, iniciativas pioneiras como o Teatro Oficina Perdiz e o Açougue Cultural T-Bone mostram que combinações inusitadas são possíveis, muito positivas e podem ajudar toda a comunidade.

O Teatro Oficina Perdiz, localizado em Brasília, na quadra 708/709 Norte, concilia há 18 anos comércio e cultura. No local, veículos são consertados de dia e peças teatrais são apresentadas durante a noite. O dono da oficina, José Perdiz, reconhece que, em seus 75 anos, poder oferecer o espaço para manifestações artísticas é uma das suas maiores satisfações pessoais. “Meu trabalho nunca foi fácil, nem tenho dinheiro para bancar apresentações. Mas ajudar os outros e incentivar a cultura é fundamental, mesmo em tempos de dificuldade”, afirma Perdiz.
Ele fornece o espaço da oficina para apresentações teatrais sem cobrar aluguel e confessa que, só depois de ver mais de 100 peças no seu estabelecimento, descobriu o sentido e o poder das artes cênicas. “Quando a gente não entende a arte, é fácil falar que não gosta. Após ver o sofrimento dos atores na montagem das peças, a ansiedade nas apresentações e nos ensaios, passei a compreender o universo por trás das cortinas e me encantei”, conta.

Para a atriz brasiliense Ana Paula Pousa, que participou da peça História de Algum Lugar, apresentada em 1996 no teatro de Perdiz, a iniciativa do mecânico deveria servir de modelo para projetos semelhantes em todo o Brasil. “É uma forma de provar que, para quem quer levar cultura para mais pessoas, espaço físico nenhum é obstáculo”, conta. Ela admite que, mesmo para o ator, contracenar em palco tão inusitado como o de uma oficina é uma experiência enriquecedora e única. “Parece que a sua arte cria dimensões muito maiores que o conjunto cortina, palco e platéia”, analisa.

A oficina foi transformada em espaço cultural por acaso, quando o sobrinho de Perdiz pediu o espaço do tio emprestado para ensaiar com seu grupo de teatro, em 1975. Mas foi em 1989 que o estabelecimento virou palco de vez. Os camarins e arquibancadas improvisados para a primeira peça no local permanecem lá até hoje. Entre 1991 e 1992, o teatro de Perdiz chegou a atrair públicos de mais de 7,5 mil pagantes, em peças históricas do local como Bella Ciao, por exemplo. A dupla funcionalidade do espaço também inspirou o cineasta Marcelo Díaz, que filmou em 2006 o curta-metragem Oficina Perdiz, vencedor do Troféu Câmara Legislativa do DF.

Açougue cultural
Mas não é só o Teatro Oficina Perdiz que mostra a consolidação do Distrito Federal como um dos grandes pólos de incentivo à arte do país. Atualmente, Brasília e o entorno contam com 19 centros culturais, 34 teatros e casas de espetáculos, 25 museus, 17 galerias, 14 cinemas e mais de 15 bibliotecas. Logo a lista será complementada com paradas culturais, pontos de ônibus com livros gratuitos à disposição dos passageiros. A iniciativa é da ONG Projetos Culturais T-Bone, filiada ao açougue de mesmo nome.

Dono e idealizador do T-Bone, primeiro açougue cultural do mundo, Luiz Amorim, coordena hoje mais de dez projetos de incentivo à leitura e às artes no Distrito Federal. Quando comprou o estabelecimento da 312 norte, em 1994, Amorim, apaixonado por literatura e filosofia, não hesitou em colocar uma prateleira com dez livros no canto da loja. Com as doações dos clientes, o acervo logo chegou a quase 10 mil volumes. Mas a vigilância sanitária achou anti-higiênico tantos livros próximos a carnes cruas e, por causa disso, interditou o local.

Ao invés de desanimar do açougue cultural devido ao episódio, o dono do T-Bone resolveu ampliar a iniciativa. Em março de 2003, Amorim alugou duas lojas na 712/713 norte e criou a Organização Não-Governamental (ONG) Projetos Culturais T-Bone. Cheio de estantes, o espaço rapidamente passou a contabilizar mais de 20 mil livros, todos de acesso gratuito e sem burocracia para a comunidade. “O açougue traz alimento para o físico, mas são os livros que abastecem o espírito”, defende Amorim.

A ONG conta hoje com o trabalho de voluntários e, principalmente, parcerias com empresas privadas e instituições governamentais preocupadas com a comunidade. Os voluntários participam das iniciativas da ONG e atuam como contadores de histórias para crianças, por exemplo, no projeto Brincando com Arte, que incentiva a literatura infantil por meio de contos, músicas e atividades recreativas.

Quem quiser também pode ajudar a ONG doando livros para a Biblioteca. Para ser melhor estruturada, a ONG passou a contratar funcionários para dedicação parcial e integral aos projetos. “No começo, quando a Biblioteca Comunitária foi fundada, muitos amigos se animaram com a idéia, mas logo foram se afastando porque não tinham tempo, tinham outros compromissos. Não dava para levar uma ONG com parcerias inseguras assim”, explica a assessora de comunicação do T-Bone Francisca Azevedo.

Paradas Culturais
Atualmente, a ONG tem projetos consolidados e de reconhecimento no DF, como a Parada Cultural, uma das iniciativas mais inovadoras do T-Bone. Os livros são colocados em pontos de ônibus da via W3 Norte, uma das principais de Brasília, e os passageiros podem pegar quantas obras quiserem. Cerca de 80 empréstimos são feitos por dia nas dez paradas da W3. As pessoas registram os livros que pegaram em um caderno, para o controle da ONG.

“Brasileiro gosta de ler, mas não tem acesso ao livro. Prova disso é que, em dois meses de Parada Cultural, já foram três mil livros emprestados”, enumera Amorim. Sobre o risco de roubo de livros, já que as paradas funcionam 24 horas sem qualquer fiscalização, o dono do T-Bone não se preocupa. “Os usuários passam por lá todos os dias, então 80% do pessoal já se conhece e um explica ao outro como funciona. Não seria um projeto cultural e social se a gente já começasse pensando que iria dar errado. Além do que, as doações ainda são maiores que as perdas”, avalia.

Usuário da parada da 712 norte, o vendedor Francinaldo de Castro Silva confessa que fica feliz em ver o ponto que freqüenta diariamente incrementado por livros. “É uma iniciativa muito legal, uma forma de levar a leitura às pessoas mais pobres e, claro, de fazer o ônibus chegar muito mais rápido”, brinca. Contagiado pelo projeto, ele já pensa em doar para a ONG as obras que guarda em casa. “Se na parada o livro leva conhecimento para mais pessoas, é bobeira deixá-lo encostado em casa”, argumenta.

A ONG ainda tem várias outras iniciativas, como o projeto Encontro com Escritores, já em sua 18ª edição. O evento reúne autores nacionais e regionais para um bate-papo gratuito com a comunidade. Às quintas-feiras, cerca de duzentas pessoas se reúnem para o Amigos da Cultura, projeto de incentivo à arte, com misto de lançamento de livros, exposições, música e saraus. Para incentivar a inclusão social por meio da educação ambiental, o T-Bone realiza o Sede de Cultura, projeto que atende crianças entre 7 e 14 anos da Cidade Estrutural, região do entorno de Brasília.

sexta-feira, 28 de março de 2008

Teatro para todos os gostos


Evelise Toporoski
Do dia 20 a 30 de março Curitiba respira, vê e tropeça em teatro, na 17ª edição do Festival de Curitiba. São mais de mil apresentações em lugares bem variados: no palco, calçada, rua, elevador, ou onde tiver um espaço para o público e o artista.

O bom é que tem peça para todos os bolsos, até mesmo os furados, com apresentações gratuitas ao ar livre e outras de R$5, R$10 até R$60 reais, com Paulo Goulart e Nicette Bruno, na comédia O Homem Inesperado.

Os atores são como nós do ruminando cultura, cada um com um sotaque, de um canto do país. Tem gente de Trancoso (BA), Mossoró (RN), Arapiraca (AL), Rio de Janeiro (RJ) e até alguns importados, como os argentinos que apresentaram o "Circo Delito" e os chilenos do "Es que El Jote Deja Mancha".

O casal da foto é curitibano e trouxe à praça Osório o Circo S/A. Palhaço Alípio e Sombrinha não passaram um minuto sem colocar sorriso em rostos carrancudos, tímidos e tristinhos.

Programa aprovadíssimo para todos os gostos!

domingo, 16 de março de 2008

Futuros

Essa é uma reportagem que eu fiz para o Dia das Crianças. Na verdade ela encerrou uma série. Nessa, em específico, tentei colocar alguns temas polêmicos e que preocupam, ou não, o futuro da garotada.
Tomei a liberdade de postar aqui. Espero que gostem.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

30 anos sem Clarice Lispector

Mesmo após três décadas de sua morte, Clarice Lispector permanece única na literatura brasileira.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Silvino Santos, o pioneiro esquecido

[Retratando a Amazônia com muita sensibilidade, Silvino Santos mostrou a Amazônia para o mundo.Hoje nem mesmo Manaus conhece quem foi o cineasta da Selva.]

Por Antonio Carlos Junior
Após o declínio da borracha, Manaus era um misto de desânimo e descaso. Pouca coisa poderia resultar em alento para o povo manauara, acostumado com o luxo, ostentação e a grandeza proporcionados pelo período áureo. Isso até que entra em cena um português, que adotou a Amazônia como sua pátria mãe. Através de sua lente, Silvino Santos (1886-1970) retratou a cultura do povo do NORTE, suas peculiaridades e seu jeito de ser como se fosse nascido na região. Apesar da sua inegável contribuição, Silvino é desconhecido pelo povo que tanto dedicou atenção em seus filmes. Apenas estudiosos e pesquisadores em busca de uma identidade regional conhecem o seu trabalho reconhecido dentro e fora do Brasil.

Biografia

Silvino Simões dos Santos Silva nasceu em Sernache do Bonjardim,pequena vila da Beira Baixa,Portugal, no dia 29 de Novembro de 1886.Seus pais,Antonio Simões dos Santos Silva e Júlia da Conceição Silva, era considerado um casal respeitado e de muitas posses. Ele foi professor primário,músico e um próspero agricultor.Além disso, o irmão mais velho de Silvino,Carlos Santos, trabalhou no comércio e teve cargos importantes em Belém e Manaus.

O que fez um garoto, aos 13 anos,cheio de regalias e sempre acompanhado de muitos séquitos parar no Brasil? A pesquisadora Selda Vale da Costa, autora do Livro “Eldorado das ilusões – Cinema & Sociedade: Manaus

(1897-1935)”, relata o espírito de Aventura.Em seu livro comenta-se que o cineasta teve uma experiência mal sucedida no seminário em Sernache. Mandado pelo pai, Silvino foi para a cidade do Porto,onde trabalhou no comércio do tio, um rico comerciante de sedas. A experiência também não obteve bons resultados. Quando estava no Liceu, Silvino Santos leu uma matéria que chamou muito a sua atenção.Na revista “Selecta Portuguesa” tinha uma matéria sobre o Rio Amazonas. Após ler o texto ele convenceu o tio e o pai, vindo então para o Brasil em Novembro de 1899 com uma família amiga.

As múltiplas habilidades do cineasta da selva

Chegando no Brasil, Silvino Santos instalou-se em Belém (Pará). Trabalhou por Três anos na livraria do senhor Taveira Barbosa. Após adoecer, passa quatro meses no interior, acompanhando um primo, dono de um comércio. Começa sua paixão por imagens: aprende fotografia com uma máquina 13x18. Aprimorou suas técnicas com Leonel Rocha, fotógrafo e pintor. Contratado por Leonel, Silvino viaja para Iquitos, no Peru, onde passa dois meses. Volta a Portugal, onde passou um ano fotografando familiares, amigos e a região. Retorna ao Brasil , novamente para Belém, em 1903.

Em 1910 instala-se definitivamente em Manaus. Um ano depois largou o emprego que tinha na loja do irmão Carlos e montou um estúdio, realizando trabalhos como fotógrafo e pintor.

Acervo

Ao todo foram 8 documentários de longa metragem, 5 de média e 83 curtas. Entre eles estão alguns caseiros e outros quando esteve em Portugal. Para o pesquisador e professor Narciso Lobo, da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), os filmes de Silvino eram de linguagem básica e de boa qualidade técnica. “Silvino teve a oportunidade de viajar até a frança, onde foi possível o contato com os equipamentos e tecnologias mais modernos na época”, comenta. Narciso é autor do livro “No rastro de Silvino Santos”, junto a Selda Vale. Para o pesquisador, Silvino foi de grande importância para o cinema, mas faltou um senso crítico em seus filmes.”O acervo dele compõe a visão da Amazônia, com suas belezas e costumes, mas sem nenhum senso crítico sobre a mesma. ”, complementa.

Para a produção, o cineasta contou com ajuda financeira para executá-los. Em 1917, o então Governador do Amazonas, Pedro Bacellar, tinha a intenção de levar a região para o mundo. Naquele exato momento, Manaus já sofria com o declínio da borracha. Surge então a Amazônia Cine-filme, uma união de governo e alguns empresários. Silvino foi contratado e teve acesso aos melhores equipamentos. Ao todo foram 12 documentários e o primeiro grande trabalho: Amazonas, o maior rio do mundo. Sugerido por um dos acionistas, Coronel Avelino, Silvino Santos passou três anos filmando. Persuadido, o Coronel entrega os negativos do filme para o noivo da filha, professor Propércio Saraiva, levando-os para revelar em Londres. Tempos mais tarde descobriu-se que o filme foi vendido para uma empresa de turismo. A Amazônia Cine-filme entra em bancarrota e Silvino perde o emprego.

Surge então a figura do maior patrocinador da carreira do cineasta: Joaquim Gonçalves de Araújo, O J.G. Na época, J.G. era o nome mais poderoso em Manaus, visto que diversificou seus negócios além da borracha, o que garantiu sustentabilidade quando a crise chegou. Mais uma vez com acesso ao melhor, Silvino pode fazer o trabalho mais conhecido: “No paiz das Amazonas”, seguido de “No rastro do Eldorado” e “Terra encantada”. Além dos trabalhos no Brasil, foram feitos 35 documentários em Portugal.

No Paiz das Amazonas – o fenômeno

Entre 1920 e 1922, Silvino Santos filmou o Amazonas e parte de Rondônia e Roraima. A intenção de J.G. era “vender o estado” para o mundo, começando pela exposição de centenário da Independência, no Rio de Janeiro, em 1922/1923. O filme teve circulação nacional e internacional entre 1922 a 1930, percorrendo a Europa e Estados Unidos. Sempre com muita repercussão, os cinemas ficavam lotados. Existem dois fatores que podem explicar o sucesso: o primeiro por ser de longa metragem (muito raro até então!) e o outro porque teve permanência longa em exibições. Os filmes naquela época não duravam mais do que dois ou três dias. Em Manaus ocorreu uma transformação: a cidade sem vida transformou-se na Manaus com seus cinemas com todos os lugares ocupados. O sudeste brasileiro reverenciou a obra, tanto que na Semana de Arte Moderna, em 1922, o filme foi considerado um orgulho nacional.

A influência do pioneiro

Na década de 1960, alguns estudantes e intelectuais, apaixonados por cinema, criaram um grupo de estudos chamados GEC (Grupo de Estudos Cinematográficos). Muitos deles tornaram-se pessoas destacadas na sociedade Manauara. Entre eles estava o escritor Marcio Souza, autor do livro MAD MARIA (que virou minissérie da Globo). Em 1969, O GEC organizou o primeiro festival Norte de Cinema Brasileiro. Como homenagem especial foi dedicado um prêmio para Silvino Santos. O radialista, crítico de cinema e jornalista Joaquim Marinho, um dos ex-participantes do Grupo, lembra como descobriram a obra de Silvino.” Em 1968, estávamos na casa de um dos integrantes do GEC,Cosme Alves Neto, e discutíamos a respeito do festival quando o pai de Cosme, encostado na Janela, sugeriu o nome de Silvino. Saímos em busca do paradeiro de Silvino.Descobrimos que ele estava morando numa casa muito simples do J.G. Araújo. Chegando lá, Silvino estava sem camisa e recepcionou com muita boa vontade. Ele cedeu seus filmes para nossa cinemática e perguntou com o sotaque de português: O que os garotos querem saber de cinema?”, lembra Marinho.

Joaquim Marinho recorda outro momento em que Silvino Santos subiu ao palco para ser premiado: “Ele fez um discurso totalmente anti-americano.Disse que os Estados Unidos dominava o Cinema e não deixava ninguém fazer. Ele esculhambou pra valer!” – Brinca o jornalista.

Daí em diante sucederam-se algumas obras sobre Silvino Santos: Marcio Souza escreveu um livro,Roberto Kahané; outro ex-integrante do GEC, fez um filme: Silvino – o fim de um pioneiro. Joaquim Marinho criou e participou de algumas obras de seus amigos: foi locutor do filme de Kahané e idealizador de um selo comemorativo a Silvino no final dos anos 80 .Além desses também seria mais uma vez locutor de um filme de J.Borges (Cineasta Paulista que morava em Manaus) ainda inédito.”Eu me comprometi a fazer o filme e nunca consegui realizar. O filme está até hoje mudo”, confessa. Em 1997, Aurelio Michiles produziu o filme Silvino Santos – O cineasta da Selva, com a participação de José de Abreu.Também participam Joaquim Marinho, Marcio Souza e Domingos Demasi, outro nome do GEC.

O fim de uma era

Silvino morreu pobre em 1970.Com exceção do GEC, apenas Aurelio Michiles lembrou dele no cinema. Para o professor Narciso Lobo o tempo foi o fator determinante: “ Silvino Santos sofreu um isolamento do tempo. Isso é uma característica do Cinema na região. Vem alguém, produz alguma coisa e cessa. Muito tempo depois vem outro e começa todo o processo do zero novamente”- Afirma Lobo. Para Joaquim marinho o cineasta sofreu o esquecimento recorrente com a maioria dos artistas no Brasil. “Tem gente que não sabe quem é Jorge Amado ou Gabriel Garcia Marquez. O Marcio Souza é um cara super intelectualizado, já fez uns trinta ou quarenta livros e só foi conhecido por causa da Rede Globo”, afirma categoricamente.

Seja pelo fator tempo ou simples descaso cultural a verdade é uma só: Silvino Santos é mais um integrante do hall dos injustiçados. Sua obra ainda é tão misteriosa quanto os segredos da região que tanto amou e registrou em sua câmera.

Saiba mais sobre Silvino Santos:

· O Eldorado das Ilusões. Cinema & Sociedade: Manaus (1897-1935) – Selda Vale da Costa. Manaus.Editora da Universidade do Amazonas,1996.

· No rastro de Silvino Santos: Selda vale da Costa e Narciso Lobo. Manaus: Superintendência Cultural do Amazonas.1987.

· A Tônica da Descontinuidade,(Cinema e política em Manaus na década de 60) – Narciso Julio Freire lobo.Manaus:UA,1994.

· Silvino Santos – O Cineasta da Selva, De Aurelio Michiles.Com José de Abreu. Vencedor do prêmio de melhor longa estreante no festival de Brasília, em 1997.



quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

A arte invade a rede

A web transforma-se em palco para novas experimentações artísticas

Taynée Mendes

Você já visitou uma galeria virtual? Caso espere encontrar fotografias de obras artísticas, assim como a foto da famosa Mona Lisa disponibilizada no site do Museu do Louvre, sairá decepcionado. Diferentemente do que muitos acreditam, o termo “galerias virtuais” abrange obras que levam em consideração a linguagem da internet na composição artística: a chamada web-arte.

Proporcionando um novo espaço sensorial e dinâmico, a web-arte utiliza a rede como forma de expressão, explorando sua linguagem e todas as suas vantagens. Aliás, vários conceitos pairam sob a web-arte, também denominada arte online ou net arte. Pode-se dizer que a diferença está nos protocolos utilizados; a net-arte engloba usos artísticos de todos os protocolos da internet (http, ftp, e-mail, MUDs, espaço virtual em 3D), a web-art refere-se a abrangência da rede WWW (World Wide Web), a parte da internet que conheceu mais forte progressão nos últimos anos.

Andreas Brogger, editor de arte da revista dinamarquesa Hvedekorn, defende que net-arte é um tipo de arte que “não pode ser experimentada em outro meio que não seja a própria rede”, ou seja, estar conectado é um critério definitivo, pois o projeto artístico “deve se transformar em função de sua presença na internet”. Embora haja diversas teorias e discussões sobre uma denominação exata desse tipo de arte, tentar definir o que é um site de web-arte vai muito além desses conceitos.

Grosso modo, o que diferencia um site de web-arte dos demais é a sua proposta. Imagine que site comum ofereça uma gama de serviços comerciais, por exemplo. Um site de web-arte disponibilizará um canal de experiências visuais, sonoras, temporais, priorizando a interação com o visitante. Uma obra de arte para a web visa a estabelecer relações com a sensibilidade do internauta, tornando a navegação – geralmente um ato banal ­– uma experiência única.

Obras de web-arte buscam resultados subjetivos, os quais são produzidos a partir do repertório visual do receptor. Assim, a leitura de típicos trabalhos de web-arte que aproveitam elementos do universo computacional (barras de navegação, botões padrão, mensagens de alerta) passa a depender do conhecimento dessas informações por parte do visitante.

O web-artista Lucas Bambozzi colecionou o lixo eletrônico que recebeu sob formas de SPAMs – mensagens não solicitadas – e, com isso, discute questões relacionadas aos espaços público e privado na rede. Quem não souber o que é SPAM, provavelmente não terá uma boa apreciação da obra. Este trabalho foi participante do núcleo Net Arte Brasil, na XXVª Bienal de São Paulo e pode ser visto em www.comum.com/diphusa/meta.

A arte que não é arte

O termo “arte” é muito difundido na rede, e isso, com freqüência, gera apropriações erradas. Confunde-se esse tipo de expressão artística com a versão aplicada da arte na web: o webdesign. Enquanto designers se esforçam por criar um aspecto cada vez mais autoral na confecção de sites com intuito comercial, os artistas da rede, por sua vez, buscam nas soluções do design elementos adequados para viabilizar seus trabalhos artísticos.

Para muitos, entretanto, não há fronteiras sólidas entre webdesign e web-arte. A partir do impressionante domínio de sofisticadas técnicas de criação e animação, muitos sites acabam recebendo o equivocado status de arte. Em contrapartida, vários artistas da rede também realizam trabalhos de webdesign. No Brasil, o artista multimídia Rui Amaral pode ser considerado um exemplo desse caso: em sua página pessoal possui tanto trabalhos de web-arte – destituídos de qualquer propósito, a não ser o artístico – quanto criações de sites que realiza com fins comerciais.

–Trabalhar com webdesign pressupõe uma funcionalidade comercial, geralmente limitada a uma empresa ou instituição. Em web-arte, embora os recursos técnicos utilizados sejam os mesmos, a liberdade de criação é muito maior, porque envolve pensamento como toda obra de arte – esclarece Rui Amaral, um dos precursores da web-arte no Brasil.

Sonho antigo

A idéia de uma sinergia entre arte e comunicação é sonho antigo dos artistas. É inclusive anterior ao advento da internet. Num momento em que se começou a valorizar a comunicação, a arte postal (ou mail art) tornou-se o primeiro movimento da história da arte a ser verdadeiramente transnacional. Estabelecida em 1963, por Ray Johnson, a arte postal reuniu artistas de diferentes nacionalidades e posições ideológicas a fim de experimentar novas possibilidades tecnológicas, intercambiando “trabalhos” numa rede livre e paralela ao mercado “oficial” da arte. Por isso ela é certamente uma das primeiras manifestações artísticas a tratar a comunicação “em rede” como objeto.

Com o desenvolvimento das recentes interfaces eletroeletrônico-informáticas nos anos 1970, a vontade dos artistas de utilizar meios e procedimentos instantâneos de comunicação em seus trabalhos também floresceu. Nesse período, vários artistas perceberam que a idéia de ubiqüidade da arte estava calcada na relação entre a arte e as telecomunicações, com a criação de projetos de ordem global. Experiências nesse campo se proliferaram, utilizando satélites, SSTV, redes de computadores pessoais, telefone, fax e outras formas de distribuição por meio das telecomunicações e da eletrônica.

A década de 1980 foi o período em que a net arte começou a tomar corpo. Ainda nesse ano, Roy Ascott deu início ao primeiro projeto de arte internacional de computer conferencing (sistema de comunicação via rede de computador que permite ler e responder mensagens dos participantes em fórum eletrônico público), entre o Reino Unido e os Estados Unidos, intitulado Terminal Consciousness. Para realizar tal empreitada, contou com o uso da rede Planet, da sociedade Infomedia. Por isso, além de teórico e artista, Roy Ascott é considerado um dos pais da arte telemática, expressão que une telecomunicações e informática.

O diferencial da arte na rede

Grande parte dos eventos em arte e telecomunicações utilizando o computador ou outros meios anteriores à internet acontecia a partir de redes efêmeras. Os artistas se reuniam em um local estabelecido, com os meios disponibilizados exclusivamente para fins específicos de determinada obra. Uma vez transcorrido o evento, a “rede” e o “grupo de participantes” deixavam de existir. O mesmo não ocorre com a internet. A partir deste advento, surge a possibilidade de se ter “espaços de interação permanentes”, para usar as palavras de Gilbertto Prado. Além de seu caráter inerentemente interativo, a internet ainda torna disponíveis os sites para o acesso de um público muito mais amplo do que o restrito universo artístico.

Falar em obras para a rede significa que o artista se utilizará dela como suporte, incorporando vários fatores inerentes ao meio na construção de sua poética. Características como hipertextualidade, instantaneidade e interatividade são somadas às obras num campo imaterial, e passam a ter alcance mundial e reprodutibilidade infinita. Qualquer criação, artística ou não, estará sujeita a estes elementos, inerentes à internet. A web-arte, em particular, poderá utilizar esses elementos de forma a centrar sua produção artística.

Entendendo a rede

Não se pode falar em web-arte, sem entender o contexto em que ela está inserida. A esse propósito se deve a pesquisa “Redes Eletrônicas, Arte e Tecnologia: novos modelos teóricos”, sob coordenação da pesquisadora Ivana Bentes, atual diretora da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professora doutora em Comunicação, Ivana Bentes, apesar de ter iniciado sua pesquisa em setembro de 2000, considera o assunto bastante atual: “Vivemos em um tempo, em que a comunicação se expande em todo mundo; câmeras digitais são barateadas, telefones celulares são popularizados, a internet passa ser uma das principais fontes de informação e entretenimento da população. Dessa forma, todo o aparato tecnológico, que utilizamos costumeiramente para se comunicar, gera propostas novas no campo artístico”.

Como surgiu o interesse em pesquisar web-arte?

O projeto surgiu de uma monografia de final de curso, dentro da minha pesquisa ampla que estuda a mídia-arte, a qual tenta entender a questão das tecnologias de comunicação no campo específico da arte. A proposta inicial é que os meios de comunicação sejam o material do artista. Não é a pintura, a escultura, nem os meios tradicionais, mas a própria tecnologia serve de inspiração para produção de “obras tecnológicas”. Na realidade, os “meios” de comunicação deixam de ser “meios” e se tornam a própria forma de expressão. O meio vira a obra. No caso da web-arte o meio em questão é a rede WWW. Eu, que sempre trabalhei com estética no audiovisual, tive a curiosidade em pesquisar essas novas formas estéticas nesse outro espaço, o da internet.

Quem produz a web-arte?

Na web-arte, questiona-se o conceito de autoria. Como as pessoas que produzem para a internet se definem? Elas são designers, ativistas políticos, programadores, performers. Essas novas formas de expressão colocam em cheque a idéia de obra de arte tradicional. Por isso, questionamentos como “onde está a arte” ou “quem a produz” são difíceis de responder.

Como a web-arte está sendo encarada no circuito de arte contemporânea?

A web-arte ainda vive uma crise de legitimação, por ser uma arte emergente. São poucas as obras de web-arte em grandes exposições de arte contemporânea. No Brasil, a web-arte se insere no contexto em que arte e tecnologia se conjugam. Em São Paulo, o Itaú Cultural representa bem essa vertente, já no Rio de Janeiro temos o Festival Internacional de Linguagem Eletrônica (FILE) e o Centro Cultural OI Futuro. Esses centros culturais ainda estão se preparando para exibir a web-arte, para entendê-la. O campo da web-arte está em constante mutação – já temos algumas obras feitas e pensadas para a plataforma 3D do Second Life –, por isso restam algumas questões. É arte? Não é arte? Vai acabar em um museu ou não vai? A web-arte é uma obra híbrida nesse sentido.

Referências:

PRADO, Gilbertto. “Arte Telemática: dois intercâmbios pontuais aos ambientes virtuais multiusuário”, Itaú Cultural, 2003

http://www.pacc.ufrj.br

http://www.fabiofon.com/webartenobrasil

http://www.comum.com/diphusa/meta

http://www.artbr.com.br/